(Para uma amiga.)
Pode parecer uma grande idiotice, mas eu gostaria de poder te salvar. Salvar a tua alma, sabe...? Talvez assim eu pudesse ter a ilusão de que salvei a minha.
Não, eu não acredito no Demônio. Inferno, talvez... É essa tua falta de esperança nas coisas. Eu não tenho esperança em nada, também. Olha o que estou dizendo! Eu, o "grande otimista". Sou mesmo um hipócrita.
Eu também estou danado, de alguma forma. Eu sinto que já não sou mais o mesmo, tu sabe... Não tenho mais o mesmo vigor, a mesma vontade de viver. Não neste mundo, feio e medíocre. Não ao lado destas pessoas, restos de corpos ambulantes. Narizes, olhos, mãos, orelhas amputadas. Restos. Estou entre restos.
Pode parecer uma grande idiotice, mas eu gostaria de salvar a tua alma. Talvez eu recebesse um perdão do mundo, uma condecoração babaca no peito, qualquer coisa assim, que fizesse eu me sentir importante. Eu sei, eu sei que é impossível. Você já está prestes a embarcar; os ventos sopram ao teu favor. As velas, as velas! Os pequenos barcos, ao longe, singram para nenhum lugar.
O que? Eu não consigo te ouvir. - Os ventos, os ventos! - Sopram violentamente. Eles nos separam, milhas e milhas. As águas são geladas e azuis. O sol não se reflete nelas; gelado e azul ele é uma cabeça esquálida no céu. Gelados e azuis como os teus olhos, as águas embalam palavras vazias de consolo. "Eu não pude, eu...". Ontem foi domingo, e eu não fiz nada de novo. As areias descobrem minhas pegadas, e logo as encobrem outra vez com um tecido áspero de nada...
- Nada neste mundo irá perdurar.